Paralimpíada foi realizada pela primeira vez em Roma, no ano de 1960
Foto: Getty Images
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Mais de 4.200 atletas de 166 países participam dos Jogos
Paralímpicos em Londres. Após mais de 60 anos, o evento esportivo
retorna a suas origens, lembrando o neurologista alemão Ludwig Guttmann,
criador da competição.
Não é exagero descrever Eva Löffler como a memória do esporte
paralímpico. A prefeita da Vila Paralímpica de Londres tem o talento
para contar piadas com suspense e, por isso mesmo, foi nomeada
embaixadora, do passado e do futuro. Durante a recepção das equipes
nacionais, Löffler remeteu a seu pai, Sir Ludwig Guttmann, o precursor
das Paralimpíadas. "Se ele estivesse hoje em Londres, estaria
infinitamente orgulhoso. Seu sonho tornou-se realidade."
A 14ª edição dos Jogos Paralímpicos de Verão foi aberta na
capital britânica nesta quarta-feira (29/08). Serão realizadas 503
competições em 20 modalidades, reunindo 4.200 atletas de 166 países.
Além de uma grande festa do esporte e recordes, os ingleses querem dar
espaço à memória. Após mais de 60 anos, as Paralimpíadas voltam a suas
raízes e, assim, à história de Löffler.
Médico precursor
Em 9 de novembro de 1938, o neurologista alemão Ludwig Guttmann,
filho de um dono de taverna judeu, concedeu refúgio a 60 judeus num
hospital de Wrocaw (hoje Polônia). Era a chamada Noite dos Cristais, em
que os nazistas realizaram uma violenta série de pogroms contra os
judeus de todo o Reich Alemão. "Quando a Gestapo chegou, meu pai
inventou doenças para eles", declarou Löffler à emissora BBC.
No ano seguinte, Guttmann fugiu para a Inglaterra com a esposa,
dois filhos e 40 marcos no bolso. Na pequena cidade de Stoke Mandeville,
a noroeste de Londres, ele revolucionou o tratamento de paraplégicos.
Eles não eram mais escondidos nos quartos dos fundos, mas recebiam
cuidado completo, e sua expectativa de vida aumentava.
"Guttmann percebeu rapidamente que desafios físicos são
importantes para portadores de deficiência", diz Rickie Burman, diretora
do Museu Judaico de Londres, no bairro de Camden Town. Ali, uma
exposição homenageia o médico com fotografias.
Em 1944, durante uma inspeção do hospital, Guttmann deu com
pacientes que corriam de cadeira de roda e, com bengalas, faziam
deslizar um disco sobre o assoalho. Guttmann entrou no jogo, e, assim,
nasceu uma nova modalidade: pólo em cadeira de rodas.
Arco e flecha
Logo depois, muitos pacientes passaram a praticar esportes. O
movimento fortalecia seus sistemas imunológicos e aumentava sua
autoconfiança. Em 1948, Guttmann organizou para os inválidos de guerra,
ao lado do hospital, uma competição de arco e flecha e tênis de mesa. Os
jogos de Stoke Mandeville foram abertos no final de julho de 1948, no
mesmo dia que os Jogos Olímpicos de Londres.
"Como judeu, meu pai se identificava com outras minorias",
relata Löffler. Aos 11 anos, ela atuou como ajudante das competições,
preparando os arcos e recolhendo as bolinhas de tênis de mesa.
"Guttmann tinham uma visão na qual muitas pessoas ainda não
acreditam: que o esporte pode unir pessoas com deficiência de todo o
mundo", diz o ex-nadador Chris Holmes. Ele é um dos mais bem-sucedidos
para-atletas da história britânica e agora é responsável pelo
planejamento das Paralimpíadas no Comitê Organizador de Londres.
"Queremos honrar o legado de Guttmann", diz.
Sob o mesmo teto
A periodicidade de quatro anos dos jogos teve início em Roma em
1960. Em 1984, as Paralimpíadas voltaram para Stoke Mandeville, pois o
anfitrião dos Jogos Olímpicos Los Angeles se negou a também receber
esportistas com deficiência.
"Esses tempos ficaram para trás", diz Chris Holmes. "Não há
separação entre Paralimpíadas e Olimpíadas, somos apenas um comitê
organizador." Pela primeira vez na história, planejaram-se ao mesmo
tempo os transportes, tecnologia e abastecimento dos dois eventos.
E a Paralimpíada deste ano alcançaram recordes antes mesmo de
começar: 2,2 milhões dos 2,5 milhões de ingressos já foram vendidos.
Seis mil jornalistas reportarão sobre o evento. Todos os 55
patrocinadores das Olimpíadas apoiam também as Paralimpíadas, que a
emissora de TV britânica Channel 4 transmitirá durante 150 horas.
Infraestrutura avançada
Os Jogos Paralímpicos de 2008, em Pequim, foram um marco para a
competição. Foram equipados com acessos para cadeiras de rodas 2 mil
ônibus e 120 paradas de ônibus. Embota no Reino Unido, a infraestrutura
para pessoas com deficiência já seja avançada, novos elevadores e rampas
foram construídos.
Os britânicos querem continuar a promover a proximidade com a
população demonstrada nas Olimpíadas. A BBC dedicou um programa de
televisão a Guttmann. E um dos mascotes das Olimpíadas chama-se
Mandeville, remetendo à cidade onde tudo começou.
Guttmann morreu em 1980, após salvar muitos inválidos de guerra.
Há poucas semanas, uma estátua de bronze do médico foi inaugurada nas
imediações de Stoke Mandeville. "A semelhança é incrível", disse a filha
Löffler. "As Paralimpíadas lhe deram um pouco de vida."
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